segunda-feira, julho 10, 2006

CHÁVEZ DE OLHO NA VARIG

Muito reservadamente, Hugo Chávez manifestou interesse na Varig. Através de emissários brasileiros, fez chegar aos funcionários da empresa a intenção de recuperar a companhia. Mas, cheio de dedos diplomáticos, avisou: só entra nessa se, e somente se, Lula entrar junto.

O problema é que o governo brasileiro dá a entender que não se importa com o destino daquela que até há menos de uma década era a melhor empresa aérea do mundo. E é esse desinteresse brasileiro que não deixou, até agora, o negócio ir à rente.

Além da Varig, também está na mira de Chávez a recuperação de outras grandes empresas aéreas da América do Sul, que passam por dificuldades. Garantir o funcionamento dessas companhias, de forma articulada, é mais uma etapa do plano chavista de integrar a América do Sul, à sua moda.

Chávez quer recuperar e manter as empresas sob controle de nacionais, privados ou não, e sempre em conjunto com os governos locais.

Essa operação envolveria as Aerolíneas Argentinas (que já tem apoio de Kírchner) e a Lan Chile, entre outras empresas.

Tudo para impedir que empresas estadunidenses e asiáticas, que não se priorizariam qualidade do serviço para consumidores e direitos trabalhistas com seus funcionários, ocupem o espaço deixado pelas tradicionais sul-americanas.

A Varig é estratégica nesse plano porque é uma das poucas companhias internacionais que possui um patrimônio invejado até pelas gigantes americanas: os slots nos mais importantes aeroportos do mundo.

Slot é, na linguagem do setor, um misto de local e horário exclusivo nos aeroportos, o que ajuda, muito, uma empresa a ganhar a preferência dos passageiros. Um bom slot significa conforto e segurança no embarque e no desembarque, e certeza de que não haverá atrasos nos vôos.

Slot não se compra colocando anúncio em jornal. Ele é negociado numa espécie de mercado paralelo. Aliás, corre à boca pequena que a TAM teria comprado por 50 milhões de dólares um slot de importância secundária em um aeroporto de Nova Iorque.

Só empresas tradicionais, como a Varig, que tem 79 anos e foi pioneira em vários aeroportos, conseguiu bons slots. Quem não conseguiu, dificilmente consegue agora. Ou paga caro, como a TAM.

Contas feitas por um diretor da Varig, os slots que a empresa conquistou em quase oito décadas de operação valem, por baixo, 400 milhões de dólares - perto de um bilhão de reais. Se a empresa falir e os slots da Varig ficarem vazios, outras empresas os ocupam.

Sem pagar um centavo.

Por fim, há, ainda, outra consideração, de cunho estratégico, que justificaria o interesse de Chávez.

Empresas aéreas têm aplicação civil em tempos de paz. Mas, como as linhas que operam são concessões estatais, podem ser requisitadas a colaborar em caso de catástrofes e, nesse caso, assumem papel de defesa civil. Na avaliação de setores nacionalistas, negociar com controladores estrangeiros a participação em resgates humanitários é muito mais difícil do que sensibilizar empresários que vivem nos países em que ocorrem as tragédias.

E, é bom não esquecer, que aviões de transporte comercial de passageiros em tempos de guerra podem levar tropas.

Tal e qual aconteceu com o navio de luxo Queen Mary, que serve à família real britânica. Durante a guerra nas Ilhas Malvina, o barco trouxe soldados ingleses para lutar contra a Argentina.

Ou com as empresas aéreas estadunidenses, que vêm “pagando” os bilhões de dólares injetados no setor pelo governo dos EUA após a crise provocada pelos ataques de setembro de 2001.

Hoje, as companhias levam tropas e equipamentos para o Afeganistão e o Iraque.