terça-feira, outubro 31, 2006

HAJA GROTÃO PARA TANTOS LULISTAS

“Um imenso grotão?

OTÁVIO VELHO

“(...) Despercebidas das camadas médias das nossas metrópoles, transformações importantes vêm ocorrendo, ainda que as disparidades sociais permaneçam imensas. Pois é em ambientes como esses que muitas vezes são implantados os programas sociais do governo. Ou seja, esses programas não só não partem do zero como também demonstram capacidade de afinar-se com o que já vinha se dando.

"(...)habitantes dessas regiões em geral sabem disso, o que explica por que nessas eleições votaram maciçamente em Lula -figura certamente paradigmática e com a qual estabelecem uma comunicação que não é só a das palavras. Assim, votaram não por terem sido submetidos a uma nova servidão, pois o que está em jogo é a libertação do cativeiro, inclusive do cativeiro político, substituído por uma disponibilidade para o estabelecimento de parcerias com os agentes sociais que estejam dispostos a se aliar a eles.(...)

“Ainda está por se fazer a teoria econômica e social de tudo isso. Mas a eleição que agora termina teve o mérito de não deixar que se continue a ignorar o que se passa, mesmo à custa de muita perplexidade. Isso porque a grande votação de Lula não permite que a consideremos como oriunda dos grotões: é impossível que haja tanto grotão assim. Além do fato de que não foram os grotões que elegeram Maluf e Enéas; e não foi o suposto centro que derrotou Severino Cavalcanti e ACM.”

Esses trechos são do artigo que Otávio Velho, professor emérito de antropologia do Museu Nacional da UFRJ, publica hoje na Folha de São Paulo.

Para os assinantes da Folha, clique em http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz3110200608.htm para ler o artigo na íntegra.

segunda-feira, outubro 30, 2006

30 ANOS DA MORTE DE SANTO DIAS

Há 30 anos, morria assassinado a tiros pela PM de São Paulo o metalúrgico Santo Dias, que participava de um piquete na metalúrgica Sylvania.

Na época com 37 anos de idade, Dias era ligado à Igreja Católica e um líder do emergente novo sindicalismo

O enterro de Santo Dias, a que compareceram cerca de 10 mil pessoas, foi mais um evento que marcou o processo de redemocratização do Brasil, após a ditadura civil e militar implantada em 1964. Foi um dos auges do movimento sindical do ABCD paulista.

Daquelas greves surgiriam a CUT, mais tarde o PT e seu líder, o ex-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo, Luís Inácio Lula da Silva, reeleito ontem Presidente da República.

sábado, outubro 28, 2006

"REVOLTA E PERPLEXIDADE" NA GLOBO

O texto abaixo, assinado por mais de 170 jornalistas da TV Globo, foi enviado a vários meios de informação no final da semana e registra a "revolta e preplexidade" destes profissionais com as acusações de que teriam ajudado a direção da empresa a manipular o noticiário sobre o dossiê dos tucanos, com o objetivo de prejudicar o PT.

"Com revolta, perplexidade e pesar, nós, jornalistas da Rede Globo, nos vemos no dever de denunciar a insistente tentativa de atingir nossa honra e nossa correção profissional por alguns supostos colegas nestes dias que antecedem o encerramento das eleições 2006.

A despeito da descrição minuciosa já divulgada pela emissora do nosso esforço para apurar com precisão as primeiras informações sobre o acidente aéreo de 29 de setembro na Amazônia, o fato de não termos conseguido obter dados fundamentais para a publicação da notícia ainda naquela edição do Jornal Nacional, mas, sim, poucos minutos depois, acabou sendo utilizado para atacar nossa idoneidade com uma impostura covarde: a acusação caluniosa de que teríamos sonegado a informação sobre o acidente, no Jornal Nacional, com motivação política.

Em nome de nossa honra, queremos registrar publicamente o repúdio aos caluniadores – sejam eles movidos por paixões partidárias ou por outras razões que desconhecemos.

Tudo o que levamos ao conhecimento dos brasileiros sobre aquele acidente estava rigorosamente correto. Nenhuma informação por nós divulgada nos obrigou, depois, a desmentidos ou correções, como aconteceu com outros veículos, que divulgaram notícias incompletas ou mesmo inverídicas. Temos a convicção de que realizamos nosso trabalho com a correção e a responsabilidade que ele exige. Só havia dois caminhos a trilhar: publicar rumores não apurados, que levariam angústia a milhões de amigos e parentes de quem pudesse ter viajado naquele dia em qualquer avião da Gol, ou publicar a notícia com o grau de precisão exigido em tragédias daquela natureza. Este seria o caminho do jornalista responsável. E foi o que decidimos trilhar, poucos minutos depois do encerramento do Jornal nacional, em plantão, com informações oficiais da Agência Nacional de Aviação Civil e da empresa Gol.

Nosso esforço, em nossas carreiras profissionais, na Globo e em outras empresas por que já passamos, é o mesmo de todos os que amam o jornalismo responsável: divulgar, antes dos concorrentes, a notícia que apuramos. Foram angustiantes aqueles momentos em que tentávamos, de todas as maneiras, divulgar a notícia a contento antes do “Boa Noite” do JN. É um daqueles momentos dramáticos que só quem trabalha em redação vivencia. Um momento que nossos colegas do jornal O Estado de São Paulo também devem ter experimentado. Diante da dificuldade de apuração de um caso potencialmente trágico, em local geograficamente isolado, o primeiro clichê do Estadão no sábado, 30 de setembro, fechado às 21:h00, nem mencionava o acidente. Na Folha de S.Paulo, tudo o que foi possível apurar no mesmo horário, para o primeiro clichê, se resumiu a uma nota na primeira página, cujo conteúdo era próximo daquele que divulgamos, no mesmo horário, em nosso plantão. E nada mais. É o preço de se fazer um jornalismo responsável.

O que não toleramos é que, no caso dos profissionais da Rede Globo, a nossa postura correta de cautela e busca da precisão seja transformada numa mentira covarde e desonesta de um certo grupo de detratores. Estes, sim, traidores de um compromisso ético do jornalismo – porque nos acusam sem o menor pudor, sem conhecimento nenhum de nossos procedimentos.

Em nome de nossa honra, nós, jornalistas da Rede Globo, registramos publicamente nosso repúdio às calúnias que têm sido feitas contra nosso trabalho na cobertura das eleições 2006. Somos jornalistas compromissados com a nossa profissão. Confiamos cada um no trabalho do colega ao lado. Jamais tomaríamos parte de complôs de natureza partidária, ou de qualquer outra, que, na verdade, têm vida apenas na cabeça daqueles que, dominados pela paixão política, não se envergonham de caluniar profissionais honestos.

Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília, Campo Grande, Cuiabá, Belém e Manaus, 27 de outubro de 2006"

Seguem 172 assinaturas.

quinta-feira, outubro 26, 2006

GARCIA E SAMUEL PINHEIRO SAEM

Mesmo considerando o que o clima pró-Lula gerado pelas pesquisas de
intenção de voto favoráveis ao petista possibilita todo tipo de
especulação, a matéria publicada no Valor Econômico de ontem(25) é, no mínimo,
inusitada. E, afinal, diz o velho ditado, onde há fumaça...

Lula estaria inclinado a dar à sua política externa uma feição mais
próxima do que se esperaria de um eventual governo Alckmin. O presidente
estaria pensando em se aproximar dos EUA e imprimir um caráter comercial à
sua atuação internacional. Deixaria em segundo plano a dimensão
eminentemente política que requer a integração regional, tida e havida como
prioritária pela administração petista e um dos resquícios de plano de
governo que encarnariam os sonhos originais dos petistas de antigamente.

Lula, diz a matéria assinada por Raymundo Costa e Cristiano Romero,
chegaria ao ponto de retirar dos cargos Marco Aurélio Garcia, seu assessor
para assuntos internacionais (e que acumula a presidência do PT com a
coordenação da campanha presidencial lulista) e Samuel Pinheiro-Guimarães,
secretário-geral do Itamaraty e formulador da política sulamericanista do
primeiro mandato de Lula.

Agora, ambos são considerados "anti-americanistas" e estariam fora do
segundo mandato. Celso Amorim, atual ministro e apontado como “pragmático”,
ficaria no cargo.

Essas mudanças, se efetivadas, alterariam o frágil sistema de apoios sobre
o qual se equilibram Hugo Chávez, na Venezuela, e Evo Morales, da Bolívia.
Ambos contam com um Lula “sulamericanizado” para conter os ímpetos
imperialistas dos EUA na região.

Segue a matéria do Valor.

“Lula prepara inflexão pró-EUA na política externa”

Raymundo Costa e Cristiano Romero

“Sem modificar o discurso, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva
prepara-se para fazer uma inflexão na política externa. Talvez antes mesmo
do início do segundo mandato. Trata-se de uma mudança de fundo,
provavelmente a maior em estudos para o futuro governo do PT, na qual a
relação com os países ricos, especialmente os Estados Unidos, voltará a ser
articulada preferencialmente, ao contrário do que ocorreu nos últimos
quatro anos.”

“Com a reeleição de Lula no próximo domingo, como indicam as pesquisas, o
chanceler Celso Amorim deve permanecer à frente do Ministério das Relações
Exteriores. Mas o secretário-geral, Samuel Pinheiro Guimarães, e o assessor
especial para assuntos internacionais da Presidência, Marco Aurélio Garcia,
devem ser estrategicamente removidos para outros postos. No exterior, caso
de Samuel, ou mesmo cumprindo alguma missão no PT, caso de Marco Aurélio,
que atualmente acumula as funções de presidente do partido e de coordenador
da campanha de Lula, mas também pode ir para uma embaixada.”

“Os dois são considerados os principais ideólogos da marca anti-americana
impressa no Itamaraty, de agrado do PT, mas que sofre profunda oposição em
áreas do governo e do empresariado. Num sinal de que a política externa
mudará, o presidente Lula avalia o conselho dado por alguns ministros:
liderar uma caravana de empresários numa visita aos EUA, já no início do
primeiro ano do segundo mandato.”

O texto completo está em
http://www.valoronline.com.br/valoreconomico/285/primeirocaderno/politica/Lula+prepara+inflexao+pro-EUA+na+politica+externa,,,60,3967552.html

quarta-feira, outubro 25, 2006

MEIRELLES FICA

“Em 2005, no auge da crise política, o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, disse ao presidente Lula, numa reunião no Palácio do Planalto, que em 2006 ele sairia vitorioso da campanha pela reeleição. Incrédulo, afinal, com a avalanche de denúncias de corrupção sobre seu governo, ele vivia o pior momento do mandato, Lula quis saber de onde o presidente do BC tirava tanto otimismo”.

Estes são alguns trechos do artigo “O Banco Central e a eleição de Lula”, publicado por Cristiano Romero na edição desta quarta (25) no jornal Valor Econômico. O jornalista adianta: se reeleito, Lula manterá Meirelles na presidência do BC.

Segue Romero: “A inflação despencou de 12,5% em 2002 para 3% em 2006, elevando o poder de compra da moeda e, portanto, dos salários. Nesse período, Lula aumentou o salário mínimo em quase 37% acima da inflação - grosso modo, vivem do mínimo, no Brasil, cerca de 40 milhões de pessoas, entre aposentados do INSS e trabalhadores da iniciativa privada, sem contar aqueles que trabalham no mercado informal” (...)

E arremata: “Se reeleito no próximo domingo, o presidente, segundo apurou esta coluna, pretende manter Henrique Meirelles no comando do Banco Central, mas gostaria que ele fizesse mudanças na diretoria da instituição. As alterações teriam um caráter mais simbólico, portanto, não afetariam o rumo da política monetária, uma vez que os juros já estão em queda“.

terça-feira, outubro 24, 2006

"LULA É AMBÍGUO. ALCKMIN, NEFASTO"

20/10/2006 | Copyleft
ENTREVISTA - EDGARDO LANDER

Lula é ambíguo; Alckmin, nefasto, diz sociólogo venezuelano

Um dos mais conceituados analistas latino-americanos avalia que a política de Lula para a América do Sul não rompeu com a ortodoxia, mas que ambigüidade ideológica possibilitou a participação do Brasil num projeto de autonomia regional frente ao poderio dos EUA. Para ele, vitória de Alckmin seria nefasta para a região

Verena Glass - Carta Maior

SÃO PAULO - No início desta semana, circulou pela internet um apelo, intitulado “Para os movimentos populares da América Latina é decisiva a derrota de Alckmin” e subscrito por mais de 80 intelectuais e lideranças sociais da região e da Europa, para que o eleitorado brasileiro não vote no candidato tucano.

O manifesto, direcionado principalmente aos eleitores de Heloisa Helena e Cristovam Buarque, não é realmente uma declaração de apoio a Lula – diz inclusive que alguns signatários têm “sérios desacordos com aspectos centrais das políticas do governo” -, mas, reforçando que isso não significa, de modo algum, que seja irrelevante quem ganhe as eleições no segundo turno, afirma que uma vitória da direita poria em risco tanto as lutas sociais quanto os projetos políticos à esquerda de parte dos governos do continente sul-americano.

A preferência de lideranças políticas da região por Lula, indicada, em maior ou menor grau de clareza, pelos presidentes Nestor Kirchner, da Argentina, Hugo Chávez, da Venezuela, e Evo Morales, da Bolívia, tem como pano de fundo o esforço de dar continuidade ao processo de distanciamento da influencia dos EUA sobre a América do Sul. E, como explica o embaixador boliviano para temas de integração e comércio, Pablo Solon, “o Brasil tem um papel fundamental no processo de autonomia da região em relação aos interesses de outros centros de poder”.

Ao menos no discurso, o Brasil também tem sido fundamental para consolidar uma visão de integração regional que tem diminuído o peso do exclusivismo da pauta econômica, para incluir no debate o conceito de “melhoria de qualidade de vida da população”, acrescenta Solon. “Se o país perder esta perspectiva, esta visão de integração para o povo, e voltar a adotar a formula tradicional de se relacionar com a região, o processo que foi iniciado pode ser abalado”, avalia o embaixador.

Idealizador do manifesto contra Alckmin, o sociólogo venezuelano Edgardo Lander, que atuou como negociador da ALCA pelo governo de Hugo Chávez, faz uma avaliação mais cética da política externa de Lula. Em conversa com a Carta Maior, Lander considera, no entanto, que, apesar da ortodoxia do governo, sua ambigüidade ideológica ainda permite a disputa de rumos. Já o projeto tucano, diz o sociólogo, traria um enorme retrocesso para a América do Sul. Leia a seguir os principais trechos da entrevista.

Carta Maior – Neste segundo turno, tanto Lula quanto Alckmin têm buscado reforçar as diferenças entre os projetos políticos que têm para o país. Na sua avaliação, estas distinções têm ficado claras, principalmente no âmbito das relações internacionais?
Edgardo Lander - Poderíamos começar a falar das coisas comuns. No debate político destas eleições, não estavam postas alternativas diferentes para o país. Por parte de Lula, não foi colocada uma ruptura com a ordem neoliberal, uma nova redistribuição da terra, ou uma transformação profunda do sistema político brasileiro. De todas maneiras, temos um presidente ambíguo, que mantém a confiança do mercado, as altas taxas de juros, que se comporta como um dirigente “responsável”. Mesmo assim, é evidente que o PT tem uma história, uma trajetória, uma sensibilidade e uma intelectualidade que, em certa medida, aspira à outra coisa.

CM – Mas no documento que convoca o eleitorado brasileiro a repudiar o candidato Alckmin, se fala em uma diferença fundamental. Onde está a distinção entre as duas propostas?
EL - Há uma coisa que não é o socialismo nem a transformação da sociedade, que é o espaço democrático. Acredito que no governo Lula há mais perspectiva de preservação do espaço democrático, de possibilidades de resistência, de luta e mobilização, sem os custos de sangue que teria um governo de direita. Mas há elementos comuns entre os dois projetos. As razões pelas quais se trancou as negociações da ALCA não foram razões de princípio, de integração latino-americana, de rechaço ao mercado ou ao neoliberalismo, mas sim um rechaço ao fato de que os EUA não são conseqüentes com sua política neoliberal, e que a agroindústria brasileira não conseguiu ampliar seu acesso ao mercado norte-americano. No governo, muitas coisas que aparecem na retórica como muito avançadas, progressistas e críticas, na realidade são defesa de interesses que pouco tem a ver com os setores populares.

CM – O senhor parece considerar a indefinição ideológica do governo Lula neste aspecto ao mesmo tempo criticável e positiva...
EL - Tomemos como exemplo a nacionalização dos hidrocarbonetos bolivianos. Através da cobertura da grande imprensa, como a Folha [de São Paulo], que reproduz a visão da direita, pudemos ver como o governo brasileiro, fortemente criticado, não foi diretamente solidário com a nacionalização, mas se comportou com suficiente ambigüidade para não colocar em perigo a estabilidade do governo boliviano. Se fosse um governo de direita, com certeza as conseqüências para o governo da Bolívia teriam sido muito mais sérias. Isso não é pouca coisa.

CM – Nos últimos anos, os governos da América do Sul têm iniciado um debate tanto conceitual quanto político sobre integração regional. Como o Brasil se encaixaria neste debate?
EL - Creio que temos de falar novamente de ambigüidades e intenções, mais do que da possibilidade de que um segundo mandato de Lula redirecione a política brasileira a outro modelo de integração. A experiência do neoliberalismo na América Latina reconformou as relações de classe de tal maneira que os setores financeiros e produtivos mais importantes se beneficiaram com uma reconcentração produtiva e do poder. Temos na América Latina severos obstáculos para uma integração diferente porque os agentes produtivos na realidade não estão interessados nisso, mas no mercado internacional. Ir contra isso significa uma ação política e de mobilização popular, e obviamente Lula não vai estar disposto a isso. Portanto, com certeza continuará ambíguo em seus discursos.

CM - Qual a sua avaliação, então, sobre a imagem da América do Sul como um bloco de governos progressistas e aliados num novo projeto de autonomia política? Na sua avaliação essa harmonia política entre os chefes de Estado da região existe? Incluindo o Brasil?
EL - O fato de que há uma vontade política de integração e relação geopolítica, e que, apesar de tudo, Lula de alguma forma reconheceu o direito do governo e do povo boliviano de nacionalizar seus recursos, não é pouca coisa. Pode ser a diferença entre a sobrevivência ou não do processo boliviano. Quando houve o paro petroleiro na Venezuela e o governo do Brasil, como forma de apoio, enviou à Venezuela um carregamento de combustivel, foi um statment político de primeira ordem. Do ponto de vista político foi importantíssimo. O fato de que, na reunião da OEA na Flórida, os EUA tentaram redefinir a carta democrática para condenar a Venezuela como país não democrático, e que houve a resistência que houve da maior parte dos países da América Latina, isso forma parte de uma nova conjuntura na região. Há dez anos, imaginar que a Alca pudesse ser derrotada era uma fantasia. E no entanto a Alca está praticamente morta. Isso é produto de um processo de resistência e denuncia dos movimentos sociais, mas também da atuação de governos.

CM – E se Alckmin fosse eleito no Brasil, qual seriam as conseqüências?
EL - O que vivemos nos últimos anos na América Latina é muito importante. Há uma dimensão política e subjetiva muito importante. Esta idéia de que há governos de esquerda, de que os presidentes têm relações fraternas, que há um apoio político em determinados momentos, isso não é pouca coisa, tem conseqüências e impactos muito fortes. Se Alckmin chega à presidência, o projeto da direita brasileira retormará o aprofundamento do neoliberalismo, da ALCA, das relações com os EUA, e isso teria conseqüências muito negativas para a América Latina. Se o Brasil opta politicamente por dar as costas à América Latina e prioriza a relação com os EUA, aí morre o projeto de integração da América Latina. Uma América Latina sem o Brasil é uma radical impossibilidade.

CM - Por isso a opção por Lula...
EL - Repito, existe ainda muito ambigüidade, estamos ainda muito insatisfeitos com as ações de vários governos, mas nos damos conta que, de toda maneira, a alternativa [a Lula] seria muito, muito pior. Os temas de integração da América Latina com Lula estão pelo menos colocados como possibilidade. Com um governo da direita, estão negados. Mesmo não apostando que Lula vai mudar num segundo mandato, podemos dizer que no governo Lula pelo menos há espaços de debate, de confrontação, um espaço de uma força que siga sendo de esquerda no PT, uma organização com capacidade de mobilização e pressão sobre o PT, o que não haveria num governo de direita. No governo Lula está aberta esta possibilidade, no governo Alckmin esta porta está fechada.

CM – Quais as possibilidade reais, na sua opinião, de uma reversão dos rumos de um segundo mandato de Lula na direção das demandas dos setores de esquerda do país e da América do Sul? Quais seriam as ferramentas para isso?
EL - O problema é que Lula chegou ao governo num momento em que a sociedade brasileira estava muito desmobilizada, se compararmos com o que eram as décadas anteriores. O governo Lula chega em condições nas quais não tem maioria no Congresso, onde os setores que ganharam com o neoliberalismo estão muito fortalecidos e numa situação de relativa desmobilização popular. O que pode acontecer num segundo governo não vai depender apenas da política de Lula, mas também se há força e capacidade de recuperar a capacidade de mobilização dos setores populares.

domingo, outubro 15, 2006

PRIVATIZAÇÃO: O PASSADO CONDENA ALCKMIN

Desde 1995, período em que vem sendo governado pelo PSDB, o Estado de São Paulo já vendeu empresas de energia, defez-se de centrais de abastecimento de alimentos e emaranhou as rodovias em uma sucessão de postos de pedágio.

A privatização em nível estadual, a exemplo do que FHC fazia no plano federal, arrecadou uma montanha de diheiro: segundo O Globo de hoje, quase R$ 77,5 bilhões. Mas, não impediu que a dívida de SP crescesse no período 33%, alcançando perto de R$ 140 bilhões.

No comando do Plano Estadual de Desestatização (o PED, eufemismo tucanês para privatização), estava o vice do ex-governador Mário Covas, um moço que depois foi eleito e reeleito, ele mesmo, chefe do executivo paulista.

Por nome Geraldo Alckmin, que agora jura de pés juntos que, se vencer Lula na corrida presidencial, não privatizará estatais.

sexta-feira, outubro 13, 2006

MAIS DOIS AMBIENTALISTAS MORTOS

Deu no portal Terra
Quarta, 11 de outubro de 2006, 10h45 Atualizada às 10h46
PF vai investigar morte de ambientalista em MG

A Polícia Federal vai investigar a morte do biólogo Eduardo Marcelino
Ventura Veado, 41 anos, e de sua mulher, a pedagoga Simone Furtini Abras, 41
anos, atropelados enquanto caminhavam, na quinta-feira, em uma estrada, em
Ipanema, na Zona da Mata de Minas Gerais. De acordo com o Estado de Minas, a
polícia suspeita que o atropelamento tenha sido proposital, pois o
ambientalista vinha sofrendo ameaças de morte por ter denunciado
desmatamentos ilegais na região.

Eduardo e Simone foram atropelados por uma picape de cor branca, às 18h45,
enquanto caminhavam pelo acostamento da rodovia. O veículo saiu de uma curva
em alta velocidade, avançou na contramão e os atingiu pelas costas. Uma
testemunha ouvida pela Polícia Civil contou que o motorista desceu do carro,
olhou para as vítimas e fugiu sem prestar socorro.

O biólogo e a esposa trabalhavam na região há 18 anos, onde criaram a
Estação Biológica de Caratinga, com 900 hectares, destinada à preservação da
Mata Atlântica e do macaco muriqui, ameaçado de extinção. A área de proteção
foi montada graças a um acordo com o fazendeiro Feliciano Abdala, já
falecido, que concordou em ceder as terras.

Redação Terra

quarta-feira, outubro 11, 2006

DÓLARES, GO HOME!

Os defensores do dólar como "moeda franca" das finanças internacionais devem estar com a orelha em pé - e ardendo.

Primeiro, Chávez propôs criar o Banco do Sul, para esvaziar o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID, hegemonizado pelos EUA) e financiar projetos de infraestrutura na América do Sul sem a utilização do dólar. Agora, são Brasil e Argentina que, ao discutir o comércio bilateral, dão mais um passo na tentativa de embotamento da moeda estadunidense.

Segundo o jornal Valor Econômico desta quarta (11), "Brasil e Argentina discutem adoção das moedas nacionais no comércio bilateral" a partir de 2007. Essa iniciativa vem no contexto do finaciamento, pelo Bndes, de mais de 30 projetos de infraestrutura na Argentina e foi divulgada ontem, em Buenos Aires, pelo ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, após ter-se reunido com a ministra argentina da Economia, Felisa Miceli.

Brasil e Argentina querem utilizar apenas real e peso, quando transacionarem entre si. Os negócios entre os dois países deve alcançar 20 bilhões de dólares em 2006.

Há cerca de mês e meio, o ministro da Fazenda, Guido mantega, ex-presidente do Bndes, já havia discutido com Miceli, no Rio de Janeiro, uma ação cooordenada dos dois países na reunião conjunta do Banco Mundial e FMI, que se realizou em setembro em Cingapura.

Miceli já está articulada com a área econômica do governo venezuelano para tocar a idéia do Banco do Sul. Tudo no âmbito da geoestratégia de afastamento da influência dos EUA na América do Sul.

Mas, em dissonância com o Brasil, que prefere manter relações mais pragmáticas com a grande nação do norte.

FINALMENTE, CRITICA-SE A "PRIVATIZAÇÃO DA AMAZÔNIA"

Finalmente, uma autoridade se manifesta de forma oficial sobre essa estória de "privatizar" a amazônia. Muito embora o Itamaraty, de quem se espera posição imediata a respeito de assuntos desse tipo, até o momento não tenha sequer tocado no problema.

A Secretária-Geral da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), Rosalía Arteaga Serrano, afirmou que está preocupada "pelas versões de imprensa relativas a supostos projetos de países não-amazônicos de privatizar ou estabelecer consórcios internacionais na Amazônia".

"A soberania dos Países Amazônicos sobre a região é plena e incontestável e que cada governo possui autonomia para proteger e gerir seu patrimônio natural", disse Arteaga, que já foi presidenta interina do Equador.

O Tratado de Cooperação Amazônica (TCA) foi assinado por Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela em 1978 para promover ações conjuntas para o desenvolvimento harmônico da Amazônia . Fruto da prioridade que o governo Lula confere à América do Sul na sua política externa, em 2003, os signatários do TCA o retiraram das gavetas diplomáticas em que ele hibernava, criaram a Organização do TCA e a sediaram em Brasília.

terça-feira, outubro 10, 2006

"PRIVATIZAÇÃO DA AMAZÔNIA” É A PONTA DO ICEBERG

Passou quase despercebida a grave denúncia publicada em página interna da Folha de São Paulo em 3 de outubro, “Governo inglês divulga plano para privatizar a Amazônia”, sem que até hoje o Ministério das Relações Exteriores tivesse se manifestado sobre o que seria um grave atentado contra a soberania dos nove países da Bacia Amazônia – em especial o Brasil, que detém cerca de 70% da região.

Porém, essa proposta pode ser apenas a ponta de um iceberg. Em verdade, ela encobriria o debate sobre o Banco Mundial, que passa por uma reorientação para manter a hegemonia dos EUA e encontrou na mudança da matriz energética mundial uma janela de oportunidade.

A matéria da Folha se baseava em artigo do jornal inglês Daily Telegraph (http://www.telegraph.co.uk/news/main.jhtml?xml=/news/2006/10/01/namazon01.xml). Dois dias antes, o Telegraph revelou as sugestões do ministro inglês do meio ambiente, David Miliband, com o apoio do Primeiro Ministro Tony Blair, para transformar a floresta amazônica em um consórcio internacional e vender as árvores a “acionistas” que manteriam a floresta em pé.

Miliband atribuiu tudo a uma “distorção” do Telegraph, conforme O Estado de São Paulo em 4 de outubro. Entretanto, a desculpa clássica perde força diante do fato de o texto do tradicional jornal inglês ter sido escrito pelo editor de política da publicação inglesa, Patrick Hennessy, um dos mais importantes jornalistas na hierarquia da empresa.

O objetivo do ministro seria deter a emissão de gases causadores de mudanças no clima no planeta, provocada pelos incêndios na mata. O desmatamento da região amazônica caiu 31%, de 2004 para 2005, mas, no ano passado, ainda foram desflorestados 18.793 quilômetros quadrados.

O Telegraph diz ainda que ”Uma figura chave por debaixo dos panos tem sido Johan Eliash, o multibilionário homem de negócios nascido na Suécia, que é tesoureiro executivo do Partido Conservador [de Blair]. No início o ano, ele comprou 400 mil acres de floresta amazônica por estimados 8 milhões de libras”.

Segundo o The Sunday Times (http://www.timesonline.co.uk/article/0,,2087-2092492,00.html), Eliash, representante do que o jornal chama de movimento de “colonialismo verde”, teria adquirido em janeiro uma área, sem localização precisa, ao norte do rio Madeira (Rondônia)

No blog de Miliband (http://www.davidmiliband.defra.gov.uk/blogs/ministerial_blog/default.aspx) o ministro inglês diz que a proposta seria apresentada em Monterey, México, uma semana depois, na reunião do G8 (o grupo dos sete países mais ricos e a Rússia, que nem é tão rica assim, mas possui três instrumentos de poder global: gás natural, petróleo e armas atômicas).

O G8 se encontrou com os 12 maiores emissores de gases de mudança no clima, Brasil entre eles, e colocaria em discussão as diretrizes do Banco Mundial para o financiamento de fontes renováveis de energia - a razão de fundo para a realização do evento.

Em busca de uma nova identidade após o fracasso da onda neoliberal, o Banco tenta se transformar no grande agente da nova economia ecológico-global e quer se tornar o maior broker de créditos de carbono do planeta, numa tentativa de transformá-los no sucessor do dólar estadunidense como moeda padrão da economia mundial.

Assim, o Banco, um dos principais vetores da hegemonia dos EUA no sistema financeiro, se anteciparia ao eventual fim da exploração economicamente viável do petróleo, o que se aguarda para um horizonte de 40 a 50 anos. Isto significaria uma ameaça à supremacia mundial de Washington, que baseia seu poder na capacidade militar e na articulação entre o monopólio da emissão de dólares com o controle das maiores reservas de petróleo do planeta.

Em Gleaneagles, o G8 determinou que o Banco Mundial elaborasse uma nova abordagem para o financiamento a energias renováveis e que a submetesse à reunião da entidade com o Fundo Monetário Internacional realizada em setembro, na ilha-Estado de Cingapura (uma cópia - vazada e não-oficial - do documento está em http://www.seen.org/PDFs/CEIF_aug06.pdf).

Propostas estapafúrdias como a de Miliband só vicejam porque há no Brasil um enorme caldo de cultura que viabiliza tais elucubrações. O País mistura a falta de prioridade na regularização e controle fundiário de vastas porções da Amazônia com uma absurda ausência de política pública para enfrentar o problema das mudanças no clima.

E, lá no fundo, o que possibilita tudo isso é o desinteresse de toda a sociedade brasileira - incluindo governo, universidades e imprensa – pela região Amazônia e pelos incidentes climáticos que vêm crescendo de gravidade no País.

LIXO RADIOATIVO É AMEAÇA AO PLANETA

Por Roberto Villar Belmonte

Monte Porzio Catone, Itália, 09/10/2006 – O principal risco ambiental do planeta não são os alimentos contaminados nem as doenças que proliferam por causa da mudança climática, mas os resíduos de urânio de reatores e mísseis, alertou o especialista norte-americano Asaf Durakovic, durante o fórum ambiental encerrados sábado em Roma. As maiores potências nucleares – Estados Unidos, China, França, Grã-Bretanha e Rússia – contam atualmente como o equivalente a cem milhões de bombas como a de Hiroshima, o suficiente para destruir sete vezes a Terra, afirmou Durakovic, diretor do Uranium Medical Research Center (UMRC – Centro de Pesquisa Médica sobre o Urânio).

Durakovic falou durante o IV Fórum Internacional para Jornalistas sobre a Proteção da Natureza, que aconteceu entre quarta-feira passada e sábado, organizado pela não-governamental Associação Cultural Greenaccord, em Monte Porzio Catone, uma localidade próxima de Roma. Desde a Guerra do Golfo contra o Iraque, em 1991, até agora, foram lançados projéteis de urânio empobrecido com 3.601 toneladas de material radioaivo, informou. O UMRC, uma ONG fundada em 1997, com sede nos Estados Unidos e no Canadá, questiona o uso da expressão “urânio empobrecido”, muito utilizada pelos militares.

O urânio natural extraído da natureza é enriquecido para ser usado como combustível nuclear, em um processo que dá origem, como subproduto, ao urânio empobrecido. Tanto este quanto o natural são compostos em mais de 99% do isótopo U328 (um dos elementos que têm o mesmo número de prótons e diferente número de nêutrons, neste caso do urânio). O material supostamente empobrecido só perde menos de 1% do urânio total nos isótopos U234 e U235. Assim, o urânio empobrecido é quase tão concentrado quanto o natural e pode conter traços de plutônio (U236), afirma o UMRC.

Ex-coronel do exército dos Estados Unidos, onde trabalhou como médico, Durakovic percebeu os riscos das novas armas atômicas quando começou a atender soldados norte-americanos que regressavam do Iraque contaminados com a radiação emitida por projéteis que também foram usados nos conflitos de secessão dos Balcãs nos anos 90, na ofensiva norte-americana contra o Afeganistão desde 2001, e na segunda guerra contra o Iraque, iniciada em março de 2003. Em 2000, Durakovic já era, há 12 anos, especialista em medicina nuclear do Departamento de Defesa. O governo o colocou para investigar a chamada síndrome da Guerra do Golfo. Mas diante de suas descobertas, recebeu ordens para suspender a pesquisa, sob pena de perder o emprego.

Durakovic continuou pesquisando por conta própria e descobriu que os veteranos não só tinham o isótopo U238 em seus organismos, mas também plutônio. Sabe-se agora que boa parte da munição com urânio empobrecido fabricada nos Estados Unidos contém esse outro elemento radioativo. Os mísseis com isótopos de urânio, que perfuram facilmente qualquer tanque de guerra, espalham uma nuvem radioativa na atmosfera. A contaminação ocorre principalmente quando estes resíduos são inalados pelos soldados ou pelas comunidades atacadas. Através do sistema respiratório, o urânio chega aos ossos e acaba comprometendo o sistema imunológico, explicou o especialista.

A equipe do UMRC também analisou a contaminação radioativa no Afeganistão. “Encontrei U236 (plutônio) em todos meus pacientes. Este isótopo não existe na natureza. Foi produzido pelo homem nestes 15 anos de guerra nuclear”, disse o médico. Nos últimos 60 anos, houve um grande acúmulo de lixo radioativo no planeta, que coloca em risco a vida terrestre, acrescentou. Há meio milhão de metros cúbicos destes resíduos de alto nível gerados pela produção de armas nucleares e mais de 40 mil toneladas de combustível usado nos reatores das centrais de geração de energia, segundo Durakovic.

Todas as alternativas de armazenamento desses dejetos aplicadas até hoje são inseguras, acrescentou o especialista. Em 1957, houve uma explosão em uma usina russa em Kyshtym, nos Montes Urais, por causa do calor gerado pela grande concentração de resíduos radioativos em um só lugar, recordou. Em sua opinião, a proposta de lançar contêineres com este lixo no espaço é uma grande bobagem, por causa do elevado custo e do risco de explosões no lançamento dos foguetes. Os depósitos marinhos foram usados no passado, mas já não são aceitos. “Todos os depósitos que existem são inseguros, verdadeiras bombas de tempo”, advertiu este especialista em radiações ionizantes. A situação é mais grave nos países em desenvolvimento.

“Um novo informe da Universidade de Ibadan destacou a total ineficácia de um depósito de lixo radioativo na Nigéria”, informou. Além disso, os testes com armas nucleares feitos tanto no mar quanto em terra também deixam grandes quantidades de resíduos e danos ambientais, destacou Durakovic. “Estamos diante de um problema, que não percebemos porque é invisível. É necessário deixar de produzir armas radioativas. Mas a fabricação não pára por causa dos muitos interesses econômicos em jogo. A retirada e o acúmulo de resíduos nucleares movem milhares de bilhões de dólares”, ressaltou o especialista. Em sua opinião, a energia atômica não poderá ser vista nunca como alternativa aos combustíveis que causam o aquecimento global. “Pode causar um efeito contrário, o inverno nuclear, pelo enorme risco de contaminação”, concluiu. (IPS/Envolverde)